A RAPARIGA QUE MOVE MONTANHAS

Os prédios altos, de arquitetura semelhante, tornam as ruas labirínticas. As subidas e descidas contribuem para o desnorte de quem desconhece os caminhos do bairro da Quinta da Princesa, no Seixal. Luísa Semedo, 29 anos, porém, sabe qual o destino de cada rua. Só detém a marcha perante um mural de graffitis coloridos. Com um sorriso, mostra a última conquista da Associação Juvenil Esperança, fundada por ela: a recuperação de um ringue desportivo. "É preciso mostrar aos jovens que, apesar de a vida ser difícil, podemos melhorá-la", afirma, desembaraçada. A Junta de Freguesia de Amora, a Câmara do Seixal e o Programa Escolhas apoiaram a realização das obras. Luísa contribuiu para mobilizar a comunidade: "Acho que tenho facilidade em chamar os jovens. Não quero dizer que consigo agarrar toda a gente, mas sou muito teimosa."  
Tudo começou há dez anos, quando o Projeto Tutores de Bairro, financiado pelo Programa Escolhas, se instalou na Quinta da Princesa. Na altura com 19 anos, Luísa tornou-se animadora, porque sempre desejara trabalhar com miúdos. "Agora, sei que foi fundamental para a minha autoestima e para a construção da minha personalidade", diz.
Decidida a garantir a continuidade do projeto, mesmo quando terminar o financiamento estatal, criou a Associação Juvenil Esperança, há cinco anos, fazendo uso do conhecimento adquirido no Escolhas. Começou por promover festas; era isso que os miúdos pediam. Aos poucos, foi conquistando voluntários e diversificando as iniciativas. Hoje, conta com três tutores, além dela própria. Promovem a ocupação de tempos livres, ajudam nos trabalhos de casa, organizam visitas de estudo, e tudo o mais que lhes pareça importante para elevar a confiança dos jovens e mostrar que "existe vida além do bairro".  
Serviço permanente 
Os resultados medem-se em cada pessoa que beneficia da Esperança. Alina Cardoso, 28 anos, costuma ir buscar roupa para os filhos e alimentos. As dificuldades multiplicaram-se há três anos, com o nascimento de Lisandro, portador de Trissomia 13, doença que causa incapacidade motora e mental profunda. Alina vive do Rendimento Social de Inserção (€320) e dos cem euros que o pai da criança lhe envia. A ajuda da associação é fundamental para lhe trazer algum conforto.
Janine Santos e Valéria Pires, ambas de 17 anos, são estudantes do 12.º ano, na Secundária de Amora, e voluntárias da Esperança. Venceram as eleições para a Associação de Estudantes pelo segundo ano consecutivo e encheram Luísa de orgulho. "É reconfortante ver que elas estão motivadas para fazerem coisas boas pela comunidade", diz.   
Durante o dia, ocupa-se da associação que criou, e mantém-se como tutora de bairro. Ao início da noite, de segunda a sexta, compõe o rendimento com a limpeza em empresas da região. "Não vou dizer que é fácil, mas os resultados dão-me força para continuar." A família queixa-se das tarefas que se prolongam pelos fins de semana. Luísa, porém, não sabe agir de outra maneira: "Trabalho desde os 16 anos, já fiz muitas coisas, mas não imagino a minha vida sem dar aos outros." O bando de miúdos que corre agora para ela há de agradecer-lhe por isso.
Prémio: Reconhecimento nacional O trabalho da Associação Juvenil Esperança, fundada por Luísa Semedo, foi recentemente premiado pelo Programa Escolhas, uma iniciativa nacional financiada pelo Estado, que promove a inclusão social de crianças e jovens. A Menção Honrosa, na categoria Impacto do Projeto Escolhas, destacou a Campanha de Solidariedade Kinta City, que recolhe roupas, brinquedos, livros e alimentos, para distribuir pelas famílias carenciadas do bairro da Quinta da Princesa, no Seixal. Já agora, a associação pode ser contactada pelo endereço associacaoesperanca@gmail.com , ou pelos telefones 96 274 79 90 e 91 567 79 99.

Fonte: Visão

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